Da negligência rural à esperança da Associação Goiana de Portadores da Doença de Chagas (AGPDC).
Quem é do centro, sabe que há uma dicotomia nesta introdução, pois quem é do centro não vive as doenças da periferia, das zonas afastadas, da selva, da roça, das áreas onde só nos resta continuar rezando para os últimos santos e caboclos que nos restam. Iniciei essa introdução, porque sou da roça, nasci e passei minha infância e juventude em rancho beira chão e casa de pau a pique, feita de adobe, usando privada e sempre próximo ao galinheiro, locais aconchegadas para o barbeiro, vetor transmissor da Doença de Chagas, só faltou terminar a frase -do centro-oeste- região de campina ou como dizia meu pai, mata-brava.
Até minha juventude, vivi neste contexto, na lida da enxada na roça, só tinha na mesa o que era plantado, graças a mãe terra. Natural dizer que a leitura de mundo compunha minha vida e esta mesma me afastava da leitura das carteiras escolares, do mundo abstrato, das somas, diminuição e, a bem da verdade sabida, dividir aprendi, pois aqueles que morávamos no distrito éramos vistos como animais, animais diferentes, pois os que frequentavam a escola eram pares distintos, distinguidos.
O Impacto da Doença de Chagas nas Áreas Rurais
Convém lembrar, que o conceito ampliado de promoção de saúde, inclui não somente a ausência de doenças, mas as condições de vida, bem – estar, acesso à educação, alimentação, moradia e um viver digno como cidadão, tudo o que não estava ao meu alcance e que muitos na atualidade não desfrutam.
Minha própria condição foi favorável ao encontro com o barbeiro e ser infectada pela Doença de Chagas, situação que perpassa de geração em geração há mais de cem anos.
Explanamos esse contexto de uma doença em que o Estado que nasci é endêmico há uma experiência vivida e fruto desta digressão dados que possam dar sustentabilidade às minhas falas e, com muita luta e reflexão, a partir de um referencial crítico e com um pouco de compreensão do processos histórico, social, cultural e histórico de saúde e dos demais direitos de cidadania. Em 2020, sobre a égide e incentivo de médicos especialistas do hospital das Clínicas, iniciamos a formatação da Associação Goiana de Portadores da Doença de Chagas, AGPDC, porém, a covid 19 interrompeu e retomamos o projeto em 2023. Após aprender e conhecer um pouco mais a respeito da doença de chagas, confesso que hoje, algo pessoal não me agrada o uso do termo “portador”, haja vista que não pedi para portar nada, e muito menos, uma chaga. A palavra “Chagas” para as pessoas, para meu vizinho e amigos não soa muito bem, é pejorativa. Depois de muitos desafios, lutas e pessoas incríveis que aderiram ao projeto, no último dia 31 de outubro de 2024, foi um dia histórico para o Estado de Goiás e para todas as pessoas Acometidas pela Doença de Chagas, pois, nesta data especial, inauguramos oficialmente a AGPDC – Associação Goiana dos Portadores de Doença de Chagas, com sede neste Distrito, em Goiás. Dentre as várias prerrogativas desta instituição, o objetivo primordial é buscar soluções para que todas as pessoas acometidas pela de doença de Chagas do Estado de Goiás, e que tenham acesso ao diagnóstico, tratamento e à qualidade de vida digna e, isso, está escrito na constituição de 1988.
Nasce a AGPDC: Uma Esperança para os Acometidos
A AGPDC, já registrada em cartório e na fase final da aquisição do CNPJ, e com um currículo de ações e participações em eventos, recentemente a instituição aderiu ao Socialsistems, uma ferramenta de gestão informacional e tecnologia de ponta para análise e correlação de dados, a Socialsistems fornece relatórios, sugestões que permitem uma compreensão ampla e aprofundada das características demográficas, sociais, econômicas, de saúde, familiar e de violência que afetam as pessoas acometidas em seus respectivos territórios.
Não queremos somente o diagnóstico e o tratamento, queremos muito mais, muitas pessoas infectadas vivem sem moradia, educação, sustento financeiro e justiça social, essas pessoas, por agravos, vivem de favores, não se aposentam e não tem condições de trabalhar.
Casos raros como a minha experiência com a doença de Chagas, consegui estudar, me tornar professora, escritora, ter informação, tratamento e desfrutar de uma qualidade de vida tão sonhada.
O município de Alexânia já institucionalizou a lei Nº. 1546, de 23 de junho de 2021, que institui o dia da Conscientização e enfrentamento da doença de Chagas, mas não saiu do papel e o município não tem nenhuma pauta para a doença de Chagas, somente aqui morreram 4 pessoas em 4 anos e sem acesso ao tratamento, no dia 31 de outubro, mais 5 pessoas testaram positivo.
Foi sancionada a lei Nº 23.031, de 14 de outubro de 2024, que institui o dia Estadual de Conscientização e enfrentamento da doença de Chagas, esperamos que nossos gestores se sensibilizem e coloquem na pauta de suas gestões a Doença de Chagas.
Desafios e Esperanças para o Futuro
Diante do exposto, a missão da AGPDC, é lutar pela implementação de políticas públicas, ações, diagnóstico e acesso ao tratamento.
aderir ao uso de um sistema de coleta de dados para conhecer e apresentar nossa realidade contundente mais próxima, fomentar o espaço de fala, desde o olhar do acometido pela doença, com uma tradução livre, porém séria e honesta da problemática que vivenciamos e não atravessa as fronteiras. Sabíamos que, desde o primeiro momento, o desafio era organizar o grupo, abastecer o pensamento com dados traduzidos pela subjetividade e não a mera condição qualitativa e quantitativa do número.
Tecnologia a Serviço da Saúde: A Importância de uma plataforma
O socialsistems é um sistema de cadastramento e análise de dados em formato dinâmico, que ofertou um novo olhar para o contexto da Doença de Chagas e é uma esperança para a resolução de um problema histórico, a negligência do Estado e também, nossa, pois, de uma certa forma, acostumamos e vivemos calados.
A AGPDC já nasce usando um mecanismo tecnológico de alto nível e que poderá de forma concreta colaborar na implantação de políticas públicas e programas para dar visibilidade às doenças e mudar este triste cenário.
