Somos uma sociedade moldada pelos mocinhos da televisão, mas já temos corpo e cara de senhor de mais de 500 anos.
Quem nunca precisou de uma mão amiga, de um apoio que o sustentasse financeiramente, emocionalmente ou espiritualmente num momento difícil? Como Dona Conceição (nome fictício), que pediu ao Padre da Paróquia que juntasse toda a comunidade para ajudar sua vizinha, cujo marido havia quebrado todos os santos que ela tinha na sua casa, além de humilhá-la publicamente gritando para que toda a vizinhança escutasse que ela não prestava mais para nada, era uma velha caduca e gagá, que só dava prejuízo financeiro, porque vivia comprando remédios, ao invés de deixar o dinheiro para ele ir para o bar.
A comunidade se reuniu e sugeriu fazer uma denúncia, dizendo que a amiga de dona Conceição deveria ser inserida no Artigo 96 do Estatuto do Idoso, que diz: “desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar uma pessoa idosa tem como pena reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, além de multa.
Assinalaram também sobre as atitudes no que diz respeito à dignidade da pessoa humana, com um agravante: a intolerância religiosa através de atitudes agressivas e violentas.
Não ser aceito é uma dor, não? Mas, todos nós sofremos rejeição. Sendo assim, um espaço comunitário de acolhimento onde as pessoas recebem palavras que ressaltam os seus valores como ser humano, e que procuram transformar os seus sentimentos de inadequação, vergonha, frustração, autocondenação, culpa, por valores eternos como fé, amor, perdão, esperança, tudo isso ajuda a vencerem os seus medos.
Também é importante conhecerem os seus direitos, e pertencerem a grupos sociais que cuidam e protegem a vida humana. Infelizmente, as catástrofes fazem parte da vida. Todo dia acontece de algumas pessoas perderem seus afetos e bens materiais. Entretanto, em meio ao caos, existem recursos interiores, comunitários e espirituais que ajudam a suportar a dor e a seguir em frente.
Olhar-se parte de uma comunidade, de um grupo, de um nicho; ou onde há um acalento é o sentido de proteção e a base da formação da sociedade humana
Elbio Néstor Suárez Ojeda pesquisou situações de desastres, no qual observou a força da solidariedade, como um fator potencializador de resiliência comunitária que ajuda na superação do sofrimento. Foi citado por Oliveira e Morais (2018), ao abordarem a comunidade como um “escudo protetor” onde a resiliência comunitária é constituída por “forças coletivas que permitem a metabolização do evento negativo e a mobilização de capacidades solidárias em direção à reconstrução”.
Entende-se que mãos unidas e laços sociais, ajudam a levantar, erguer, animar e estimular as pessoas. Ou seja, é a força do coletivo para protegê-las em situações de vulnerabilidade. Alguns abrigos espirituais, possuem um cantinho de consolação, onde, após as orações, as pessoas podem falar sobre sua dor, o seu medo de seguir em frente, suas inseguranças, fraquezas, e também sobre o que fazer para se sustentarem, como no caso acima da amiga da dona Conceição.
O jornal Diário da Manhã, em 2018, publicou um artigo enfatizando a Resiliência Espiritual como sendo o caminho da perseverança, rendição à vontade de Deus. Outro recurso dos abrigos espirituais é contribuir para o desenvolvimento da resiliência espiritual, onde a fé na força invisível traz a paciência de saber esperar por um novo dia, e firmeza para continuar caminhando, apesar de todo o sofrimento e a não desistir no meio do caminho. É um espaço de desenvolvimento de valores eternos como o perdão, que ajuda a liberar a raiva da vida por ter nos tirado aquilo que a gente achava que era “nosso”. É o semear da esperança de dias melhores.
Abrigo espiritual é lugar de “aconchego amoroso”, de confiança na sabedoria divina, numa força maior que sempre faz o melhor, e, no final, chegamos à conclusão de que tudo aquilo que passamos nos tornou uma pessoa menos egoísta, menos orgulhosa, pois aprendemos a ser humildes e a sair da nossa autossuficiência para pedir ajuda. Nos tornamos menos prepotentes, pois constatamos que não mandamos na vida, e que não determinamos os acontecimentos.
Neste lugar de fortalecimento, observa-se o compromisso com a paz social e com os nossos irmãos de caminhada, pois se recebe palavras de incentivo para reagir, e enfrentar as lutas com coragem. A resiliência espiritual se faz presente, quando se compreende que a vida não é do jeito que queremos, e que Deus não erra. É entregar o nosso futuro nas mãos da força invisível que cuida de todas as estações, e saber que no amanhã “o sol vai nascer sem o nosso consentimento”.
O exemplo histórico de cair do cavalo foi demonstrado por Paulo de Tarso quando trocou a sua arrogância, a ambição desmedida por poder, o orgulho, e a vaidade por perceber que tinha efeito escolhas equivocadas. Entretanto, ao invés de ficar se martirizando por ter tido comportamentos inadequados, colocou o seu foco no que deveria mudar em si, e levantou-se para seguir por outro caminho.
A amiga de Dona Conceição estava se sentindo impotente, e não sabia como transformar a situação, além disso, viu todos os sonhos de um casamento de longos anos caírem por terra, sentia-se paralisada, sem saber o que fazer e nem para onde ir, sentindo-se sozinha. Assim, o auxílio do grupo espiritual lhe encorajou a continuar a caminhada.
Infelizmente, muitas pessoas também estão vivenciando uma situação de exclusão social em seus trabalhos, suas famílias, sentem-se sozinhos por não poderem mais confiar naqueles que deveriam ser fonte de apoio e suporte. Buscam esconder a sua dor, o seu medo de sonhar. Se isolam, ao invés de descobrirem locais que ajudam a curar suas feridas, e incentivá-los a dar a volta por cima.
As decepções fazem parte da vida. Entretanto, é importante buscar algo que nos restaure, que nos ajude a reagir de forma inteligente, que traga clareza e paz as nossas preocupações.
Cuidar de nosso EU interior é cuidar de minha comunidade
Cuidar da nossa parte espiritual é tarefa para vida inteira e não só para a velhice, pois ninguém sabe a hora que irá atravessar a fronteira da imortalidade. Os abrigos espirituais são constituídos de solidariedade, que é o cuidado de não abandonar o irmão que está sofrendo. A proteção espiritual é a visão de que o universo é infinito, embora a nossa visão seja limitada. Aliás, esse processo poderia ser resumido em uma palavra: humildade.
Que possamos desenvolver a humildade para aceitar as nossas imperfeições, os nossos limites, sem negar a força do universo. Assim, como o cantor Leo Jaime, também acredito que ninguém veio para o mundo a passeio, e, “enquanto a gente pensa que sabe de tudo, o mundo muda de cena em menos de um segundo…”
A resiliência espiritual transforma a “queda do cavalo” em um ganho, pois a perda passa a ser vista como um benefício, um livramento, um milagre. A pessoa se ilumina interiormente, se pacifica e torna-se mais vigorosa e forte espiritualmente. É o recomeçar com sabedoria e virtude, talvez até por um novo caminho de evolução e crescimento, mas com conexão aos direitos humanos e ao compromisso de tornar esse mundo mais justo e fraterno.